Líderes indígenas querem o fim da tutela do governo federal. A possibilidade foi discutida durante a Conferência dos Povos Indígenas realizada em Dourados na semana passada. O tema foi um dos mais polêmicos do encontro, que reuniu cerca de 200 índios de sete etnias de Mato Groso do Sul. O guarani-kaiowá, Anastácio Peralta é um dos defensores da idéia. Segundo ele, a tutela em mais de três décadas em vigor não cumpriu seu papel. “A tutela, que na teoria serve de proteção, não evitou a exploração de nossas terras e de nossas matas e nem conseguiu evitar que os índios ficassem livres do álcool, das drogas e da violência”, disse.
A tutela foi instituída oficialmente em 1.973 com a promulgação do Estatuto do Índio e tem a missão de oferecer proteção à comunidade indígena, mas sem limitar ou reduzir os direitos. As medidas tem a essência de resguardar a vida civil do indígena. Nas negociações fundiária por exemplo, são nulos os atos praticados entre índios não integrados (sem contato com os brancos) e qualquer pessoa estranha à comunidade indígena quando não tenha havido assistência do órgão tutelar competente, ou seja, a Funai.
Mas apesar da “proteção”, o guarani-kaiowá Silvio Paulo, um dos organizadores da Conferência em Dourados, afirma que os indígenas vivem outra realidade se comparada com a época em que o Estatuto do Índio foi criado na década de 70. “Hoje o índio está integrado, somos leitores, políticos e precisamos ser considerados cidadãos como o branco ou o negro”, disse. As discussões sobre o assunto também serão feitas na Conferência Nacional dos povos indígenas, prevista para o ano que vem.
FUNAI
A Funai afirma que a tutela ainda é vista de “forma equivocada” pela sociedade. Segundo o coordenador geral de Defesa dos Direitos Indígenas, Vilmar Guarani, a tutela visa proteger o direito coletivo e não individual do indígena. O próprio Estatuto do Índio, apesar de ser considerado ultrapassado, prevê que qualquer índio poderá requerer ao juízo competente a sua liberação do regime tutelar desde que preencha alguns requisitos como ter mais de 21 anos, ter conhecimento da língua portuguesa e possuir razoável compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional.
Vilmar Guarani considera que a discussão é importante, mas alega que antes de qualquer decisão é preciso resguardar as diferenças culturais entre os povos. A Funai, o Brasil possui uma imensa diversidade étnica e lingüística, estando entre as maiores do mundo. São 215 sociedades indígenas, cerca de 55 grupos de índios isolados onde se fala pelo menos 180 línguas. “Temos informações de que pelo menos 14 etnias no país não têm qualquer contato com a sociedade nacional. Essas pessoal não têm nem idéia do que seja tutela, muito menos podem discutir o fim dela”, frisou Guarani.