Conferência milionária revolta índios
Evento que vai discutir os rumos da saúde indígena no País será realizado em resort de luxo
A saúde indígena está em pauta nessa semana. Entretanto, o debate não está agradando aos mais interessados no assunto: os índios. Enquanto a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) prepara a 4ª Conferência Nacional de Saúde Indígena, representantes de diversas etnias dizem que o dinheiro gasto na convenção poderia ser destinado ao combate de doenças.
A Conferência de Saúde Indígena acontece entre os dias 27 e 31 de março em um dos mais sofisticados hotéis de lazer do Centro-Oeste. A Pousada do Rio Quente é um badalado resort localizado a 31 quilômetros do município de Caldas Novas, em Goiás. Serão cerca de 1 mil participantes durante os cinco dias do evento. Desses, 600 são delegados indígenas. As diárias do resort variam entre R$ 360 e R$ 426 por pessoa, dependendo do tipo de acomodação. Somente em hospedagem, estima-se um custo mínimo de R$ 2,5 milhões. A assessoria de comunicação da Funasa informa que o investimento aplicado na Conferência não será divulgado, visto que é assunto de interesse interno da Fundação.
O que as lideranças indígenas denunciam (cujos nomes e Estados de origem serão mantidos em sigilo) é que a indicação dos delegados para a Conferência passa pelo crivo de funcionários da Funasa ou da Fundação Nacional do Índio (Funai). ‘Os delegados são apenas pessoas que já pertencem à Funasa e que não vão apontar as falhas. Existem índios manipulados pela Funasa, da confiança deles. Não vai quem quer não! Caldas Novas não é lugar para fazer a convenção. Tinha que ser em Brasília, perto do poder, da imprensa e da solução para os nosso problemas. A questão da saúde indígena está uma total vergonha’, acusa um dos representantes da etnia Pancararu.
Já o representante dos Terena diz que os delegados são indicados também pela Funai, através da coordenação de defesa indígena. ‘O índio recebe tudinho, despesas, direito a ficar no hotel, pago pela Funasa’. Um representante Tupinambá e um da etnia Kayapó endossam que a destinação do dinheiro para a realização do evento seja impróprio diante da crise. As 1.330 vagas disponibilizadas no resort já foram preenchidas.
A intenção do governo federal é anunciar as medidas e os resultados das ações da Funasa no período entre 2000 (quando assumiu a gestão de saúde) e 2005. O presidente do órgão, Paulo Lustosa, fará a abertura oficial do evento que contará também com a presença do ministro da Saúde, Saraiva Felipe. Na ocasião, será assinada portaria que institui o Fórum Permanente de Presidentes de Conselho Distrital Indígena, a ser constituído legalmente, com direito a orçamento próprio.
O evento promovido pela Funasa ainda contará com extensa programação cultural, com danças típicas, mostra de cinema e cerimônias de benzimento feitas pelos pajés.
Os principais temas da Conferência desse ano serão o Direito à Saúde, o Controle Social e Gestão Participativa, os Desafios Indígenas Atuais, a atuação dos Trabalhadores Indígenas e Não-Indígenas de Saúde, além da Segurança Alimentar e Nutricional e Desenvolvimento Sustentável.
Temas esses cujas soluções ainda não foram encontradas nestas duas décadas. As políticas (ou a falta de políticas) de saúde para os índios resultaram em, dentre outros escândalos, registros de morte de crianças por desnutrição no Mato Grosso e o aumento de 164% nos casos de malária dentre os Yanomami da Região Norte.
Casa de Icoaraci foi reformada após denúncias e pressão de manifestantes
A Casa do Índio de Brasília é um dos exemplos da falta de recursos. Além das péssimas condições de infra-estrutura, os indígenas reclamam a falta de atenção básica de saúde para quem precisar permanecer na capital. O rompimento da fossa séptica que veio a desaguar os coliformes fecais justamente na cozinha onde são preparadas as refeições dos ‘hóspedes’ indígenas impede a alimentação adequada e ameaça a saúde de todos.
Um caso emblemático na área da saúde é o da indiazinha Tititu, da tribo Suruwahá, do Amazonas. Após idas e vindas entre São Paulo, Manaus e Brasília, a pequena hermafrodita retornou à aldeia depois de uma operação para solucionar o problema de nascença. Tititu nasceu hermafrodita e seria sacrificada. A menina fez a cirurgia corretiva, porém, precisa de medicamentos diários para não morrer, devido ao desajuste hormonal.
A coordenação da Funasa no Amazonas assumiu a responsabilidade de levar o medicamento necessário a Tititu. Porém, em campanha motivada pelo gabinete do deputado federal Pastor Reinaldo (PTB-RS) aponta que o medicamento não chegou à aldeia e que Tituti já está sem o remédio desde ontem. Em apenas três dias a criança correria o risco de morte súbita. Entretanto, o remédio leva dez dias para chegar à aldeia se levado por via fluvial a partir de Manaus.
Coliformes fecais na cozinha
A Casa do Índio de Brasília é um dos exemplos da falta de recursos. Além das péssimas condições de infra-estrutura, os indígenas reclamam a falta de atenção básica de saúde para quem precisar permanecer na capital. O rompimento da fossa séptica que veio a desaguar os coliformes fecais justamente na cozinha onde são preparadas as refeições dos ‘hóspedes’ indígenas impede a alimentação adequada e ameaça a saúde de todos.
Um caso emblemático na área da saúde é o da indiazinha Tititu, da tribo Suruwahá, do Amazonas. Após idas e vindas entre São Paulo, Manaus e Brasília, a pequena hermafrodita retornou à aldeia depois de uma operação para solucionar o problema de nascença. Tititu nasceu hermafrodita e seria sacrificada. A menina fez a cirurgia corretiva, porém, precisa de medicamentos diários para não morrer, devido ao desajuste hormonal.
A coordenação da Funasa no Amazonas assumiu a responsabilidade de levar o medicamento necessário a Tititu. Porém, em campanha motivada pelo gabinete do deputado federal Pastor Reinaldo (PTB-RS) aponta que o medicamento não chegou à aldeia e que Tituti já está sem o remédio desde ontem. Em apenas três dias a criança correria o risco de morte súbita. Entretanto, o remédio leva dez dias para chegar à aldeia se levado por via fluvial a partir de Manaus.
‘Qualidade’ foi uma exigência
A realização da Conferência no resort em Caldas Novas foi apontada pela representante Carmem Pancararu como uma solicitação das lideranças indígenas por um evento de ‘qualidade’. Carmem coordena o Fórum dos Presidentes, que reúne os 34 Distritos Sanitários Indígenas (Dseis) em todo o País e ressalta que ‘a Funasa, inclusive, simplesmente, acatou muitas das decisões tomadas pelas lideranças indígenas em parceria com o Conselho nacional de Saúde’.
A coordenadora, entretanto, afirma desconhecer o valor total empregado pela Funasa para a realização do evento. Carmem alega que ‘me causa estranheza depoimentos dessa natureza. São pessoas que não estão vivendo nas bases’. A coordenadora destaca que a realização da Conferência é resultado de cinco anos de debates em todas as instâncias, sempre a parti das bases e pela primeira vez chega-se à realização de um evento com a ‘total participação indígena em todo o processo’.