Planalto não debaterá Previdência com servidor
Dirceu avisa a sindicalistas que as negociações serão feitas somente no Congresso
BRASÍLIA – O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, fechou as portas do governo para qualquer negociação em torno da reforma da Previdência com os servidores públicos. Dirceu e mais sete ministros assinaram ontem com entidades representativas do funcionalismo um termo de compromisso, criando uma comissão permanente para discutir interesses da categoria que não estejam relacionados com as reformas. O ministro transferiu para o Congresso negociações sobre o projeto.
“O Congresso é o espaço de repactuação da reforma. O ministro (da Previdência, Ricardo) Berzoini está aberto ao diálogo, mas o Congresso é o espaço privilegiado”, afirmou Dirceu após o encontro.
Dirceu pediu para ser o último a discursar. Assim, poderia responder a qualquer afirmação mais provocativa. Ao ouvir o pedido de retirada da proposta de reforma da Previdência, reiterou que não há mais espaço para negociações a respeito. “Este é um governo de partido, de coalizão partidária, e existem negociações no Congresso”, afirmou.
Ainda no ato de assinatura do termo de compromisso, o ministro quis deixar claro que o governo não negocia a reforma da Previdência, mas não está fugindo do debate: “Vocês nos conhecem e sabem que sempre estamos com a guarda em alta e preparados para a disputa política e social. Nós não corremos do debate político e da disputa franca e democrática.”
A declaração foi recebida como um desafio pelos líderes dos servidores, alguns visivelmente irritados com a dureza do número 2 do Palácio do Planalto. “Essa é uma posição de enfrentamento deles. Quanto a nós, se não pudermos atingir a ponta do queixo deles, pelo menos tentaremos desgastar, minar a resistência deles”, afirmou o tesoureiro do Sindicato Nacional dos Docentes (Andes), Antônio Luís de Andrade.
Houve um cabo-de-guerra entre os ministros e os servidores, na cerimônia de assinatura do compromisso. O representante da Federação dos Servidores do Judiciário Federal (Fenajufe), Cláudio Azeredo, tentou pegar os ministros de surpresa, obrigando-os a assinar um documento com um pedido de audiência com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os ministros assinaram o papel e Dirceu anunciou que levaria o pedido a Lula. Um pouco depois, afirmou que a direção das entidades nunca havia pedido a audiência. “Foi a primeira vez que solicitaram o encontro. Eu levarei o documento ao presidente ainda hoje.”
O porta-voz da Presidência, André Singer, confirmou que o presidente recebeu do ministro o pedido de audiência dos servidores e informou que o encontro “certamente ocorrerá depois das viagens do presidente”. Singer ressaltou que a importância que o presidente atribui ao diálogo com o movimento sindical e com o funcionalismo pode ser medida pelo fato de que nunca tantos ministros se reuniram com esses setores.
Reorganização – Dirceu pediu ainda que as divergências sobre a reforma da Previdência não atrapalhem o prosseguimento das demais negociações com os servidores, em torno do que ele chamou de “reorganização do Estado”.
“Não devemos confundir a reforma da Previdência com a determinação do presidente de restaurar o serviço público no País”, observou o ministro, referindo-se ao processo de terceirização e esvaziamento de algumas carreiras. “Queremos reverter aquela tendência a que todos nós fizemos oposição.”
De acordo com o ministro, o governo Lula tem por compromisso resgatar o papel do Estado brasileiro na regulação, fiscalização, indução do desenvolvimento e redução das desigualdades sociais. “As dificuldades são muitas, o caminho é longo, mas a nossa disposição é reorganizar o Estado brasileiro, laico e democrático.”
De acordo com o protocolo para a instituição formal de uma mesa nacional de negociações, “a democratização das relações de trabalho, tanto no setor público como no privado, constitui verdadeiro pressuposto para a democratização do Estado, para o aprofundamento da democracia e para a garantia do exercício pleno de direitos de cidadania no País”. Os servidores, mesmo os das alas mais radicais, enalteceram a assinatura do protocolo, porque jamais, na história do País, foi feito algo semelhante.
O objeto da negociação permanente será a busca de soluções para os interesses manifestados pelas partes. A pauta inicial prevê discussões sobre a estruturação de um sistema permanente de negociação, estabelecimento de normas para melhorar a qualidade dos serviços públicos e encaminhamento das bases legais para a implementação do sistema de negociação permanente entre funcionalismo e governo.