Anarquismo e Poder Popular
Por Federação Anarquista Insurreição 04/07/2003 às 01:28
Indymedia Brasil
Texto de reflexão militante sobre o anarquismo
O Poder Popular é um conceito que cada vez mais vem sendo utilizado por distintos segmentos e organizações populares e revolucionárias na América Latina e no mundo todo. O anarquismo organizado e militante junto às lutas do povo, igualmente levanta esta bandeira, pelo menos desde a década de 50. Nas ruas de Paris em 1968, podia-se ver claramente as faixas defendendo a construção do Poder Popular nas mãos da militância libertária, assim como nas manifestações operárias e estudantis impulsionadas pelos anarquistas uruguaios da FAU em seu próprio país, a partir de 1956. No Brasil, no entanto, a defesa do Poder Popular por militantes anarquistas que atuam junto as lutas do povo, tem gerado alguma confusão e polêmica.
Como os anarquistas podem propor a construção do Poder Popular se combatem o poder? Poder Popular e ditadura do proletariado são a mesma coisa? Estas são algumas questões que surgem quando se fala em Poder Popular no interior de muitos espaços anarquistas no Brasil. Em primeiro lugar, é preciso deixar claro que nem todos os segmentos político-ideológicos da esquerda que levantam a bandeira do Poder Popular, estão defendendo a mesma coisa. Muitos grupos, principalmente os marxistas ligados ao maoísmo, entendem a construção do Poder Popular como a construção da ditadura do partido único, o seu próprio, obviamente. Os anarquistas, por sua vez, defendem o Poder Popular de uma forma radicalmente diferente.
O Poder Popular, para o anarquismo, é o poder exercido pelo povo organizado contra seus inimigos (a classe dominante e o Estado) no sentido de avançar em direção ao socialismo libertário. Sua origem está no desenvolvimento e articulação da luta e organização popular em suas mais diversas esferas, seja estudantil, sindical, comunitária e assim por diante. É muito importante ter claro que o Poder Popular é um projeto de poder revolucionário não-estatal, exercido pelas classes oprimidas e populares a partir de seus organismos de base articulados entre si. A democracia direta e o federalismo são a carne e os ossos da proposta de Poder Popular dos anarquistas, porque somente tendo por base estes princípios, a luta e organização do povo, podem concretamente se constituir num foco de contra-poder e apontar para a construção de uma sociedade socialista e libertária.
O avanço combativo das lutas populares, e a coordenação de seus vários movimentos e organizações em um sentido revolucionário, são a única alternativa para que o povo consiga resistir aos ataques do poder burguês, e ainda faze-lo recuar até ser destruído. O Poder Popular é como uma semente que plantada hoje, torna-se amanhã uma imensa árvore. Entender a revolução como um grande cataclisma que de um dia para o outro desmantela o capitalismo e instaura a anarquia, é um equívoco grave e desmobilizante. A revolução, na verdade, é um processo que se constrói diariamente, lutando para organizar, e organizando para lutar junto ao nosso povo, contribuindo para o desenvolvimento da capacidade dos movimentos e organizações populares fazerem valer seus interesses e necessidades contra aqueles do inimigo opressor. Assim, o momento da ruptura e destruição do capitalismo e do Estado é fruto de um processo anterior e não o começo do processo revolucionário.
O Poder Popular, ou o poder democrático e federalista do povo organizado, desenvolvendo-se a partir do interior mesmo da sociedade capitalista, avança contra o poder burguês até destruí-lo, impondo-se como forma de organização política da sociedade socialista libertária. Construir e avançar o Poder Popular é fazer a revolução. Os soviets na Revolução Russa de 1917, os conselhos operários na Revolução Húngara de 1956, e as assembléias populares na Argentina de hoje, são frutos do processo de construção do Poder Popular que defendemos. Os anarquistas devem preocupar-se seriamente com a discussão sobre um projeto de poder que seja capaz de destruir o capitalismo e construir uma nova sociedade sem reproduzir a dominação estatal, caso contrário estaremos fadados a repetir os erros cometidos na Comuna de Paris e na Revolução Espanhola, onde a ausência de tal projeto levou-nos diretamente de uma situação muito favorável a uma amarga derrota.
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